Andreo Gustavo tem 34 anos fez a transição do feminino para o masculino, o lema de vida é lutar contra o preconceito
My Zen Life - Andreo com que idade é que começou a perceber que não se identificava com o género com que nasceu?
Andreo Gustavo - Desde muito cedo que o meu instinto me dizia que era diferente. Recordo-me de ter cerca de seis anos e achar que era um rapazinho como os outros. Lembro-me ainda de com cerca de 9 anos, chorar na minha cama à espera que a fada-madrinha viesse com uma varinha mágica para me transformar num menino. Só consegui perceber realmente que era uma pessoa trans já depois de dois anos em consultas de psicoterapia. Tinha 23 anos.
MZL - Nessa altura falou com alguém, amigos, pais?
AG - Enquanto criança e pré-adolescente nunca falei com ninguém. Nem mesmo com a minha irmã gémea.
Escrevia no meu diário alguns pensamentos e sentimentos e penso que a minha mãe os tivesse sabido a certa altura da adolescência. Só mesmo quando bati no fundo da depressão, tristeza e ideação suicida, por volta dos 18 anos, é que decidi contar aos meus pais o que sentia, pensava sobre mim e sobre a minha vida.
MZL - Como foi a reação?
AG - Quando lhes contei disse algo como: “como sabem, sempre fui diferente da mana e acho que sempre me senti um rapaz, por isso estou a ter acompanhamento psicológico para descobrir a minha identidade e felicidade.” Reagiram como qualquer responsável parental, penso eu: ficaram surpresos e assustados. Mas talvez diferentemente do que eu esperaria, foram muito prestativos e apoiaram-me no processo. Estiveram sempre lá para mim. Tanto pais, como irmã, avós e tia.
MZL - Falar, debater, assumir, é importante?
AG - Claro que sim, tentando ao máximo simplificar conceitos que podem parecer confusos para algumas mentes mais tradicionais e conservadoras. A verdade é que esses conceitos surgem apenas da necessidade de clarificar e explicar, porque na realidade tanto as identidades trans como as orientações sexuais não heterossexuais existem há milhares de anos! Simplesmente a sua existência foi apagada pelo colonialismo, pela política e pela religião.
MZL - A 20 de novembro assinala-se o Dia Internacional da Memória Transgénero. É importante assinalar e quebrar barreiras. O que se pode fazer?
AG - É um dia em que recordamos as pessoas trans que perderam a vida por serem quem são. Infelizmente, o ódio que muitas pessoas sentem contra as pessoas trans, espalhadas pelo desconhecimento e desinformação faz com que pessoas como eu não só ponham fim à sua vida, como todos os anos sejam brutalmente assassinadas e violentadas. Eu celebro por estar vivo, ainda! E celebro a luta que outras pessoas fizeram por mim para que eu possa hoje estar vivo. Nenhum ser humano deveria ser morto por ser quem é. Qualquer pessoa pode fazer mais pela causa, começando por informar-se corretamente com fontes fidedignas sobre o que é a identidade de género e o que é ser trans.
Na nossa plataforma TransParente temos diversos cursos simples para que todas as pessoas possam aprender.
MZL - O que gostava de dizer às pessoas que passaram (ou estão a passar) pela mesma situação?
AG - É importante que descubram quem são e o que as faz verdadeiramente felizes. Ser trans é apenas uma parte de si! Há esperança e apoio nos seus caminhos, mesmo quando as famílias não são esse apoio.
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